Milhares de pessoas lotaram o Largo São Francisco, os corredores, escadarias, janelas e pátios da mais antiga Faculdade de Direito de São Paulo, além de lotar o Salão Nobre e outros auditórios. No dia do advogado e do estudante, após a leitura da carta Em Defesa da Democracia e da Justiça, iniciativa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), no ato ocorrido no Salão Nobre, o Pátio das Arcadas foi tomado por estudantes para a leitura da “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito!” – o mais amplo manifesto pró-democracia na história do País – com acúmulo de 930 mil adesões.
Antes dos atos, religiosos cristãos, islâmicos e de matriz africana, chefes de cozinha e militantes sem terra, do coletivo Banquetaço, montaram uma mesa de pães em pleno Largo São Francisco, onde a defesa da democracia foi celebrada de forma mística, distribuindo pedaços do alimento para os presentes. Os pães artesanais foram dispostos de forma a escrever a palavra “Democracia”.
Embora a unidade em torno dos documentos evitasse mencionar o presidente da República, os gritos de “Fora, Bolsonaro” ecoavam de todas as partes de dentro e fora do prédio. As cartas são uma resposta às declarações golpistas do presidente, contra a Justiça Eleitoral do país e as urnas eletrônicas. Apesar do frio, vento e garoa, pessoas levaram seus cartazes, se fantasiaram de animais, levaram crianças, se manifestaram contra a fome. Parte da multidão partiu em direção à avenida Paulista, em passeata.
Com predominância de estudantes e militantes sociais, o pátio das Arcadas foi o espaço da leitura da “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito”. Em vários pontos da faculdade e nas ruas ao redor, as pessoas podiam participar assistindo a transmissão por telão.
Bela Gil achou importante participar diante das ameaças que percebe à democracia. Ela destacou a possibilidade de poder reunir tanta diversidade de pessoas nas ruas em defesa de seus direitos democráticos, “unindo forças por um Brasil melhor”.
Casagrande disse que a Carta contribuiu para que as pessoas entendessem a dimensão do ataque que a democracia vem sofrendo. Ele disse que tinha dúvida se, com as redes sociais, as pessoas iriam às ruas. “Nós estamos saindo!”
O presidente da Central de Trabalhadoras e Trabalhadores do Brasil (CTB), Adilson Araújo, disse que o ato demonstra que a sociedade está tomando consciência da importância da defesa do Estado Democrático de direito. “Estamos numa encruzilhada em que as dificuldades vividas pelo nosso povo justificam uma resposta à altura. Bolsonaro é uma ameaça à nação, ao povo e a um sistema eleitoral reconhecido em todo o mundo. Nada justifica os arroubos autoritários de um governo genocida”, disse o sindicalista.
Bruna comemora os 85 anos de lutas da União Nacional dos Estudantes em meio a um momento histórico para a democracia. “A UNE construiu essa trajetória na luta contra o nazifascismo, contra a ditadura militar e em defesa da redemocratização do país. Queremos que as gerações que nos antecederam tenham orgulho desta que está a frente da defesa da democracia, neste momento”, afirmou.
“O significado maior desta unidade é o de defender, manter, ampliar aquilo que nos é de mais caro, que é a democracia”, disse Marina Silva. “A democracia é a condição para que a inteligência de uns não queira substituir a inteligência de todos, o poder de todos não seja substituído pelo poder de alguns. A condição para que tenhamos muitos olhares, muitas escutas e fazeres e saberes na hora de resolver grandes problemas. Sem ela, a gente vai estar subtraído daquilo que não está com nenhum de nós, que é a inteligência coletiva. A força coletiva está entre nós”.
O diretor da Faculdade de Direito da USP, Celso Campilongo, também destacou a diversidade social em torno do manifesto. “Aqui nós temos a reunião de sindicalistas, de empresários e de movimentos sociais da sociedade civil. Isso mostra que as eleições já têm um vencedor, este vencedor é o sistema eleitoral brasileiro. Este vencedor é a legalidade do estado democrático de direito sempre. Principalmente, o mais importante, o vencedor da eleições é o povo brasileiro.”
Foi feita uma homenagem aos signatários da Carta aos Brasileiros de 1977, que também reuniu a sociedade civil brasileira em torno da defesa da democracia e pelo fim da ditadura militar. Aquela carta também foi lida no 11 de agosto, no mesmo Pátio das Arcadas.
O manifesto foi lido por Eunice de Jesus Prudente, professora da faculdade de direito da USP e da faculdade Zumbi dos Palmares, autora da primeira tese que propõe a criminalização da discriminação racial, em 1980. Maria Paula Dallari Bucci, professora da faculdade de direito da USP; Flávio Flores da Cunha Bierrenbach, um dos articuladores da carta aos brasileiros de 77 e ex-ministro do Tribunal Superior Militar; e Ana Elisa Liberatore Silva Bechara, professora e vice-diretora da Faculdade de Direito da USP.
Foi relatado pelos responsáveis pela iniciativa que a carta já foi endossada por 727 porteiros, 8.973 desempregados, 5.045 enfermeiros, 4.217 motoristas, 6.619 policiais, 519 delegados de polícia, 28.868 engenheiros, 15 mil médicos e 4231 magistrados, entre outros. Todos os presidenciáveis, com exceção de Jair Bolsonaro (PL), assinaram o documento, assim como ex-presidentes e políticos.
A carta sofreu ataques hackers para impedir as assinaturas, mas tem sido lida constantemente nas redes sociais por artistas de todo o Brasil. O texto foi publicado também em inglês, espanhol, francês, italiano e alemão e expõe internacionalmente o isolamento do presidente Bolsonaro, em suas críticas ao processo eleitoral e à urna eletrônica.
Fonte: Vermelho