As vinícolas gaúchas Aurora, a Garibaldi e a Salton têm muito a agradecer ao MPT (Ministério Público do Trabalho). O vergonhoso acordo que as empresas firmaram em 9 de março com a promotoria parece mais um indulto oficial do que uma reparação. Do valor da indenização ao destino dos recursos, tudo cheira mal e precisa ser revisto.
Na noite de 22 de fevereiro, uma operação resgatou nada menos que 208 trabalhadores que prestavam serviço para essas vinícolas em condições análogas à escravidão. Todos eles haviam sido recrutados por uma empresa terceirizada, a Fênix, para trabalhar na colheita de uva.
Além de viverem num alojamento precário cedido pela Fênix em Bento Gonçalves (RS), na serra gaúcha, os trabalhadores recebiam remunerações baixíssimas, não tinham direitos básicos e ainda eram torturados. “Achava que iria morrer, porque eu estava brigando com três. Um me dava uma gravata, outro vinha com spray de pimenta, outro com cadeiradas, pauladas, choques e até mordida”, contou um desses trabalhadores à Folha de S.Paulo.
Em princípio, a rapidez com que o MPT e as vinícolas chegaram a um acordo deveria ser motivo de celebração. Da notícia sobre o resgate dos trabalhadores até a assinatura do TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), passaram-se apenas 13 dias. Mas, diante das contradições que o acordo embutiu, essa rapidez deixou a negociação com cara de operação-abafa.
As empresas se comprometeram a pagar R$ 7 milhões em indenização por danos individuais (aos trabalhadores) e coletivos (à sociedade). O valor, irrisório, corresponde a apenas 0,46% do faturamento anual das três vinícolas e não leva em conta a gravidade do caso. Além de envolver três grandes empresas, o resgate de trabalhadores em Bento Gonçalves foi o maior já registrado no Sul do País e no cultivo de uva.
Por sinal, desde o início do escândalo, a resposta das produtoras, restrita a notas e comunicados, era criticada pelo tom frio e cerimonioso. Passadas três semanas da divulgação do caso, nenhum dono ou executivo dessas empresas apareceu em público para se solidarizar com os atingidos – até mesmo os pedidos formais de desculpas das empresas soaram protocolares demais. O montante disponibilizado para as indenizações só confirma a falta de sensibilidade.
Porém, nada é mais revoltante no acordo do que a falta de compromisso com as vítimas. Dos R$ 7 milhões que serão destinados à indenização, somente R$ 2 milhões irão para os 208 trabalhadores resgatados. Cada um deles receberá pouco mais de R$ 9 mil – ou “o mesmo que os tribunais superiores concedem por bagagem aérea extraviada”, conforme lembrou o advogado e professor Thiago Amparo, da FGV.
Fonte Vermelho